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sexta-feira, 10 de abril de 2015

Um pouco sobre a história da natureza dos raios-x

Quando quebramos algum osso do corpo, normalmente o médico pede um "raio-x" da parte quebrada para ver qual o estado da fratura. Fazer um "raio-x", como normalmente se diz, é extremamente comum hoje em dia. Mas qual será a história deste mecanismo que utilizamos tanto atualmente? Este texto tem como objetivo não necessariamente discutir o primeiro experimento que levou ao desenvolvimento dos raios-x, mas sim a discussão que se seguiu após sua descoberta com a intenção de se entender a natureza destes raios. Esta discussão foi quase completamente extraída da primeira referência citada abaixo.

A letra "x", em raios-x, representa o mistério da origem e natureza desses raios quando foram descobertos pela primeira vez em 1895 pelo físico alemão Wilhelm Rontgen. Para produzir tais raios, é necessário um aparato como mostrado na figura abaixo.


Um filamento de tungstênio é aquecido através de uma corrente elétrica, levando a uma emissão de um fluxo de elétrons deste material. Ao incidir sobre um alvo, os elétrons desaceleram, perdendo assim energia. Esta energia emitida pelos elétrons são os chamados raios-x.  Basicamente os raios-x são influenciados por duas causas, sua desaceleração frente ao impacto com o alvo, e o material de que é feito o próprio alvo. Assim, se estivermos interessados em construir um gráfico da intensidade dos raios-x como função do comprimento de onda desses raios, obteremos uma curva chamada espectro de energia do raio-x. Esta curva é devida a desaceleração dos elétrons, o que, portanto, independe do material do alvo, e também devido ao material do alvo, o que então resulta em uma curva característica para cada alvo.

Voltando ao tema principal do texto, a descoberta do raio-x havia sido feita e a questão de sua natureza foi amplamente discutida desde o início. Vale então mencionar que alguns cientistas pensaram que estes raios eram vibrações longitudinais no "éter", pois a ideia do éter como meio que permeava todo espaço ainda não havia sido completamente descartada. Ora, isso era um indicativo de que alguns pensavam que a natureza do raio-x era corpuscular. Por outro lado, outros físicos suspeitavam de que os raios fossem ondas transversais análogas à luz e, portanto, a natureza do raio-x seria ondulatória. 

O experimento chave que demonstrou o caráter ondulatório dos raios-x foi idealizado por Max von Laue e realizado por Walter Friedrich e Paul Knipping em 1912. Ondas, diferentemente de partículas, são caracterizadas pelo fenômeno de interferência, consequência direta do princípio da superposição. Desde modo, um experimento que utiliza dois seguimentos de raios-x e tivesse como consequência um padrão de interferência, serviria como prova de que os raios-x são ondas, tal como a luz.

O que estes cientistas fizeram foi usar a teoria de sólidos conhecida na época para estudar os raios-x. Já em 1850, Bravais introduziu na cristalografia a teoria de que os átomos em cristais são organizados em uma rede espacial. Assim, Laue supôs que se os raios descobertos por Rontgen fossem constituídos por ondas eletromagnéticas, então era esperado que ao ser incidido por ondas eletromagnéticas, os átomos dos cristais iriam adquirir certa quantidade de energia e então vibrar, e deste modo a estrutura de rede iria dar origem ao fenômeno de interferência. A figura abaixo mostra uma ilustração de raios-x incidindo sobre um arranjo cristalino e o posterior raio emergente, após o fenômeno de interferência. "lambda" é o comprimento de onda do raio-x, "theta" ângulo incidente e "d" a distância entre os planos cristalinos.



No experimento realizado em 1912, os raios-x eram incididos em um cristal, no caso sulfato de zinco. Os raios emergentes deste cristal incidiam em placas localizadas a diferentes distâncias do cristal. Se a suposição de que os raios-x fossem ondas eletromagnéticas estivesse correta um padrão de interferência seria formado nas placas, ou seja, um máximo central, seguido por máximos secundários seria observado. Após refinar o experimento, o resultado obtido foi a figura abaixo.



Ou seja, um padrão claramente de interferência, confirmando, portanto, o caráter ondulatório dos raios-x! Laue formulou algumas equações objetivando localizar os máximos de interferência. Entretanto, sua análise estava ligeiramente incorreta e um entendimento conclusivo foi dado por Bragg, que propôs que os raios-x incidentes eram compostos por uma distribuição continua de comprimentos de onda, e que os máximos eram produzidos por interferência, não dos átomos individuais (como sugeriu Laue), mas sim de feixes refletidos que incidiam sobre os diversos planos paralelos que formavam a rede cristalina. 

Portanto, ficou evidenciado através deste experimento que os raios-x são ondas eletromagnéticas. Obviamente, a explicação do efeito fotoelétrico por Eistein de que ondas eletromagnéticas possuem também um caráter corpuscular, abrange a natureza dos raios-x.

Vale mencionar que a descoberta dos raios-x conferiu a Rontgen o prêmio Nobel de física em 1901. Além disso, Laue foi ganhador do prêmio Nobel de física em 1914 pela descoberta da difração de raios-x em cristais.


Referências:

Livro: Landmark Experiments in Twentieth Century Physics, George L. Trigg, Ed. Dover (1975)



http://cen.xraycrystals.org/introduction.html (extraída a terceira figura)

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