Atualizando a descrição do blog: Tive a intenção de criar este blog para divulgar conceitos, fatos históricos, curiosidades e outros temas sobre a grande ciência física. Existem muitos outros blogs sobre o assunto, mas a minha intenção principal é tentar escrever sobre assuntos de física vistos na graduação ou de pesquisa física para o público geral. Minhas ideias sobre temas para as colunas surgem de textos e artigos que vou lendo ao longo do meu trabalho acadêmico. Discussões são sempre bem vindas!
Abraço a todos!

terça-feira, 5 de maio de 2015

Uma discussão sobre conceitos da mecânica quântica

Eu não sei ao certo o quanto os leitores deste blog conhecem sobre mecânica quântica. Mas penso que independentemente do nível de cada um, o tema com certeza é interessante para todos. Esta coluna trata sobre o tema "mecânica quântica", mas não é um texto fechado. Eu resolvi escrever aqui um texto baseado na minha última leitura, cujo livro é "Física âtomica e conhecimento humano", escrito por Bohr. Na verdade, é um livro que recomendo a todos que queiram ter mais conhecimento sobre a filosofia por trás da mecânica quântica, sem se apegar a estrutura matemática propriamente dita. A ideia aqui é escrever algo acessível a todos.



Bem, sabemos que os eventos ao nosso redor são governados pela mecânica clássica, a física de coisas grandes e não muito rápidas, quando comparamos com a velocidade da luz no vácuo. E sabemos que os eventos que estão relacionado com coisas pequenas, tais como átomos, elétrons, prótrons etc, são governados pela chamada mecânica quântica. Existem muitas diferenças entre a mecânica clássica e a mecânica quântica, tais como o fato de que a primeira é determinística, no sentido em que medimos algo com 100% de certeza, enquanto a última é uma teoria estritamente probabilística, no sentido de que, ao realizarmos uma medida, temos uma probabilidade associada ao resultado que estamos interessados em medir; quase nunca este resultado será 100%. Outras diferenças serão apresentadas ao longo do texto. 

Outra coisa importante entre as duas teorias, clássica e quântica, é como uma se relaciona com a outra no limite em que ambas as teorias são possíveis de serem aplicadas. Por exemplo, suponha que temos um sistema quântico, ou seja, que este seja descrito pelas leis da mecânica quântica. Podemos deixar este sistema evoluir no tempo de tal modo que, após algum tempo, ele se comporte classicamente, ou seja, passamos a usar a mecânica clássica para descrevê-lo. O estudo desta transição "de quântico para clássico" é muito importante e ainda não é completamente entendido nos dias de hoje.

Algo relevante também a se dizer é sobre como observamos algum sistema quântico, e aqui a discussão poderia ganhar proporções enormes. Vamos dar um exemplo. Ao estudarmos um sistema clássico, usamos, portanto, um conjunto de variáveis e conceitos clássicos; ao realizarmos uma medida neste sistema clássico, fazemos isso mais uma vez com um conjunto de "ferramentas" clássicas. Portanto, não há diferença entre entidades usadas na descrição e entidades usadas na realização de medidas. O mesmo não ocorre quando estudamos um sistema quântico. O conjunto de conceitos e entidades usadas para definir um sistema quântico são, como era de se esperar, formados por conceitos da mecânica quântica. Entretanto, quando vamos realizar uma medida em um sistema quântico, só há uma possibilidade de fazermos isso, e é através de um conjunto de definições e "ferramentas" clássicas. Tudo que observamos ao nosso redor, observamos com conceitos da mecânica clássica, e com sistemas quânticos isso não poderia ser diferente. Esta é a única opção que temos de realizar uma medida sobre qualquer sistema.

Esta equação representa o fenômeno de superposição em mecânica quântica. Quando realizamos uma medida sobre o sistema quântico, em geral temos uma probabilidade associada aos resultados possíveis de serem obtidos. Aqui, a seta para baixo e para cima são os resultados possíveis, enquanto c1 e c2 são as probabilidades associadas, de modo que c1 + c2 = 100%.


O fato de termos apenas um modo conceitual de olharmos para um sistema quântico nos leva para algo importante em mecânica quântica, algo conhecido como complementariedade. Vamos exemplificar este conceito através de um exemplo muito educativo. Vamos supor que nosso sistema quântico seja a luz, e queremos estudar a natureza da luz. Ao realizarmos o chamado experimento da dupla fenda, observaremos franjas de interferência, o que significará para nós que a luz tem uma natureza ondulatória. Por outro lado, se realizarmos outro experimento, conhecido como efeito fotoelétrico, verificamos que a luz tem uma estrutura granular, ou seja, de pacotes, e assim concluiremos que sua natureza é corpuscular. Este é um claro exemplo de como o fato de o sistema ser constituído por conceitos diferentes daqueles usados para realizarmos a observação faz toda diferença. O conceito de complementariedade na mecânica quântica surge no sentido de realizarmos todas observações necessárias sobre um sistema quântico afim de obtermos a maior quantidade de informação possível sobre o sistema. Isso fica um pouco claro quando realizamos os dois experimentos distintos acima. O primeiro, que mostra o caráter ondulatório da luz, nos fornece a frequência e comprimento de onda da luz. Já o experimento que mostra o caráter corpuscular da luz nos fornece o momento da luz, muito embora ela não tenha massa.

Espero com este texto ter apresentado aos leitores um pouco da enorme diferença conceitual existente entre a mecânica clássica e a mecânica quântica, enfatizando que, embora as definições e conceitos usados em ambas as mecânicas sejam muito diferentes, o modo de observamos um sistema clássico e um sistema quântico é sempre o mesmo, ou seja, através de um conjunto de "ferramentas" clássicas. Vamos voltar a este assunto em um próximo texto, explorando outras peculiaridades da teoria quântica e tentando mostrá-las sempre de uma maneira conceitual clara.

Referências:

- Física atômica e conhecimento humano, Niels Bohr, Ed. Contraponto, 1996.

- Decoherence and the Appearance of a classical world in quantum theory, Ed. Springer, 1996.

2 comentários:

  1. muito obrigado novamente não é a primeira vez que estou aqui e novamente adorei que escreveu desde já lhe agradeço pelo conhecimento transmitido

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    1. Muito obrigado pelo comentário, Carlos.
      É um prazer saber que o que escrevo é útil para as pessoas.
      Não sei se já viu, mas tenho um canal no youtube também, chamado Leituras de Física.
      Abraços e continue por aqui.

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