Atualizando a descrição do blog: Tive a intenção de criar este blog para divulgar conceitos, fatos históricos, curiosidades e outros temas sobre a grande ciência física. Existem muitos outros blogs sobre o assunto, mas a minha intenção principal é tentar escrever sobre assuntos de física vistos na graduação ou de pesquisa física para o público geral. Minhas ideias sobre temas para as colunas surgem de textos e artigos que vou lendo ao longo do meu trabalho acadêmico. Discussões são sempre bem vindas!
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sexta-feira, 27 de abril de 2012

Colisões de matéria escura com o ser humano

           Recentemente em um site considerado um "depositário de artigos científicos" foi inserido um novo artigo que diz sobre um estudo que conclui que em média, um ser humano é atingido por uma partícula de matéria escura por minuto. Obviamente, existem muitas especulações e aproximações nos cálculos realizados para se chegar a este valor. Entretanto, quando vi tal artigo, achei interessante escrever uma coluna dizendo algo sobre matéria escura e sobre a modelação da matéria escura para se poder considerar uma "partícula de matéria escura"
 Em cosmologia, é comum considerar os constituintes básicos do universo como sendo: fótons, matéria bariônica, matéria escura, neutrinos e energia escura. Fótons são pequenos pacotes de energia, ou as partículas de interação da força eletromagnética. Por matéria bariônica entendemos todo tipo de coisa formada por prótons, nêutrons e elétrons, como estrelas, planetas e os seres humanos. Os neutrinos são considerados como partículas necessárias quando se impõe algumas simetrias às leis físicas. Neutrinos são geralmente considerados como partículas de massa nula, porém alguns estudos recentes mostram que aos neutrinos pode ser atribuído um pequeno valor de massa. Todos estes elementos citados até aqui e os seus papéis na evolução do universo são praticamente bem entendidos na física e cosmologia. Devemos ressaltar, antes de ir em frente, que a designação "escura" deve-se ao fato de os físicos não saberem do que é constituído tais elementos. 


Porcentagem dos constituintes do universo. Tudo que conhecemos, como estrelas, planetas e nós, estamos incluídos em Átomos.

 Existem fortes evidências para supor a existência de algo chamado "matéria escura" no universo. Definimos aqui matéria escura como sendo matéria não bariônica, ou seja, matéria não formada por prótons, nêutrons e elétrons. Além disso, não há interação entre matéria escura e matéria bariônica, ou simplesmente matéria. A explicação para o fato de não haver interações entre esses dois tipos de matéria é que se houvesse qualquer tipo de interação, os astrofísicos ou astrônomos já teriam detectado algum tipo de radiação resultante. A mais simples explicação para supor a existência de matéria escura no universo é devido ao fato de que com o valor da densidade de matéria bariônica hoje bem conhecido observacionalmente em nosso universo, ele deveria ser bem diferente do que o é. Então, como é comum em cosmologia ou qualquer outra área da física de altas energias, suposições são feitas de modo a preencher os vazios nas teorias existentes de forma a ficarem coerentes com os dados observacionais. Vale a pena ressaltar que matéria escura nada tem a ver com anti-matéria. Anti-partículas, como o pósitron, já foram detectados e são muito bem entendidos. 
Bom, supondo então a existência de algo denominado matéria escura, os físicos precisam construir modelos teóricos, ou melhor dizendo, modelos efetivos, que possam dar conta de explicar a dinâmica de interação dessa matéria escura e de sua dinâmica ao longo da evolução do universo. Existem muitos modelos para matéria escura. Os próprios neutrinos, devido a sua interação com outras partículas ser extremamente fraca, já foi um candidato bombástico nos meios teóricos. Entretanto, no modelo de matéria escura usado no artigo que me referi acima e um dos candidatos mais fortes atualmente são as WIMP's (Weakly interacting massive particles ou partículas massivas fracamente interagentes). Quando se diz aqui "fracamente interagentes", devemos supor uma interação realmente muito, mas muito fraca, incapaz de ser detectada atualmente com os melhores aparelhos. A designação fraca dessa interação serve tanto para interações entre matéria escura e matéria bariônica quanto para interações entre as próprias partículas escuras. 
 Sendo um assunto ainda teórico, as considerações e caminhos a se seguir teoricamente são imensos. Uma família de partículas escuras pode ser suposta de modo a dar conta de todas as interações que elas venham a sofrer. Portanto, devemos ter em mente que, para o cálculo realizado no artigo para quantificar a taxa de colisão de uma partícula de matéria escura com nosso corpo foram utilizadas as seguintes considerações básicas:
1)  A matéria escura, algo que não sabemos ainda o que de fato é, foi modulada efetivamente como sendo WIMP's;
2) Essas partículas, sendo seus valores de massa de repouso extremamente pequenos, interagiram normalmente com matéria bariônica nos primeiros estágios do universo. Hoje, entretanto, elas viajam pelo universo "free-streaming", ou melhor, viajam livremente sem interagirem praticamente com nada;
3) Dessa viagem sem interação, elas ocasionalmente cruzam a Terra e, mais ocasionalmente ainda, chocam-se com um ser humano;
4) Dado o fato de que 23% de toda energia do universo é composta por matéria escura, podemos supor a existência de muitas partículas wimp's, de modo que, depois de muitos e muitos cálculos, concluiu-se que a média de choques de uma partícula wimp com um ser humano é aproximadamente uma por minuto.
          O fato é que tais colisões e muitas outras que estão neste momento ocorrendo entre as mais diversas partículas e nosso corpo não causam nenhum dano ao nosso organismo. Moléculas de CO2 sim nos prejudicam.

Nota: O elétron não é um bárion. Entretanto, em cosmologia, costuma-se chamar de bárions tanto prótons e nêutrons como também elétrons. É meramente uma questão de nomeclatura.

O artigo, ainda em processo de avaliação, pode ser visto na íntegra em pdf no site do arxiv: http://arxiv.org/pdf/1204.1339v1.pdf.

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